26/03/2008

Salvo pelo Pato

Assistir a um jogo do Brasil é sempre uma emoção, ainda mais quando se está há mais de seis meses longe de casa. Por isso, não tive nenhuma dúvida quando soube que a seleção brasileira iria jogar contra a Suécia no Emirates Stadium, aqui em Londres. A comemoração dos 50 anos da primeira Copa conquistada pelo Brasil, que foi como o amistoso foi anunciado por aqui, certamente valeria as 35 libras do ingresso.


As camisas amarelas nas vitrines das lojas de esporte de Londres anunciavam a partida, mas hoje poucos sites ingleses deram atenção ao jogo. O ibope da visita do presidente francês Sarkozy e sua primeira-dama Carla Bruni ao Reino Unido e do jogo da Inglaterra e da França em Paris estava bem maior.

Quem me conhece sabe que não entendo quase nada de futebol (e estou correndo um sério risco ao falar do tema aqui), mas curto a experiência. A falta de Kaká e Ronaldinho Gaúcho em campo já não dava bons sinais e só posso dizer que o jogo foi morno. Não dá pra fugir da sensação de que a partida foi salva da monotonia pelo gol do Pato.

Mais do que o jogo, no entanto, foi legal ver o clima do estádio inglês contaminado pela cultura brasileira (ainda que para o bem e para o mal). Quando estive no jogo entre o Arsenal e o Newcastle no mesmo estádio em setembro, fiquei impressionada pela tranquilidade dos comentários (apesar dos receios do meu pai, não vi hooligans por aqui) e pelas músicas de torcida relativamente calmas.


Hoje, o estádio mais parecia um Maracanã lotado. Muita cantoria, berros, cornetas e as famosas holas deram um ar mais brasileiro ao Emirates. Teve o lado ruim também: gente sacudindo bandeiras impedindo a visão dos que estavam atrás e gente batucando nas cadeiras e nas paredes do estádio.
Aliás, uma coisa que me chamou a atenção foi a quantidade de bandeiras e camisas de times brasileiros (Corínthias, São Paulo, Grêmio, Flamengo, Vasco, Fluminense e até do Vitória da Bahia). Não entendo muito a lógica: torcer pelo Brasil e pelo time têm o mesmo significado?

Outra coisa: a onda amarela (que também tinha alguns representantes da Suécia, claro, mas quantidade bem menor que a dos brasileiros) mais uma vez confirmou a sensação que qualquer um tem por aqui: Londres está repleta de brasileiros. Não é possível privacidade alguma ao falar português no metrô, por exemplo.

Apenas algumas pérolas do que ouvi há pouco:

- "Estou aqui no estádio, o Brasil vai jogar com a Suíça (sic) e eu vou aparecer na Globo" (brasileiro falando no celular)

- "O Anderson está comendo muito breakfast inglês, por isso que está lento"

- "O Ronaldo está aposentado?" (pergunta de um inglês)



24/03/2008

Primavera ou Inverno? Páscoa ou Natal?

Esta neve fina está caindo lá fora agora, confirmando uma ameaça anunciada desde semana passada. São flocos bem finos, talvez seja preciso um esforço na vista para observar na foto (clique na foto para ampliá-la). Uma chuva de granizo na sexta-feira, alguns flocos no sábado, muito frio em todo o feriado e enfim a neve chegou nesta segunda de Páscoa aqui em Londres. Sim, aqui na Inglaterra ainda é Páscoa e a Easter Monday é feriado (mas não se animem, aqui a quinta-feira não é feriado nem meio-feriado e todos trabalham normalmente).

Desde fevereiro as temperaturas tinham aumentado e algumas pessoas já tinham trocado os casacos de inverno por outros mais leves, mas eis que o tempo muda novamente. Não que haja muita regularidade nisso aqui também. A sensação às vezes é que vivemos todas as estações do ano em um só dia: sol e chuva vão e vêm sem a menor cerimônia.

Mas não há como não admitir que é um início insólito para a primavera. Assim como os dias de sol em fevereiro fizeram os locais estranhar, já que o segundo mês do ano é considerado um dos mais cinzas do inverno.
A dúvida do título não foi minha, mas da freira responsável pela abertura da cerimônia de Páscoa ontem na Abadia de Westminster. Ela desejou a todos uma Feliz Páscoa, mas disse que facilmente poderia confundir e desejar um Feliz Natal, considerando o frio que fazia lá fora. A solista nos proporcionou momentos de muita sensibilidade com os cânticos de Páscoa que celebravam a ressureição, mas confesso que senti falta da luz de velas das cerimônias celebradas na mesma abadia em dezembro.

21/03/2008

Van Gogh e batatas

O post da Irlanda me lembrou uma obra simplesmente sensacional do Van Gogh que tive o privilégio de ver quando visitei o museu Van Gogh em Amsterdã, em outubro do ano passado.

O quadro "Os comedores de Batata" (The Potato Eaters) foi pintado pelo holandês em 1885, já algum tempo depois do início da Grande Fome que assolou a Europa, mas principalmente a Irlanda depois da praga nas plantações de batata.

Primeira pintura de larga escala de Van Gogh (82 cm x 114 cm), o quadro é de uma luminosidade sombria e de detalhes muito especiais como o rosto dos agricultores e suas mãos. Impossível não se impressionar.

Para ver o quadro, clique aqui. O site do museu vale a visita. Além de todas as obras da coleção permanente do museu, tem também muitas das cartas que Vincent Van Gogh escreveu durante sua vida, principalmente para o irmão Theo, seu principal incentivador e patrocinador também.

Dia da Irlanda

Com um certo atraso (a máxima antes tarde do que nunca vai ter que me salvar aqui), queria registrar as comemorações do Dia de São Patrício (St Patrick's Day), padroeiro da Irlanda. O país tem uma tradição forte de emigração desde a década de 1840, quando a Grande Fome acometeu a Irlanda por conta de uma praga que destruiu as plantações de batatas. Os irlandeses estão presentes em todo o Reino Unido e os Estados Unidos, mas há comunidades espalhadas também no Canadá, Austrália, Argentina, México e África do Sul.
Acredita-se que São Patrício tenha sido o responsável por levar o cristianismo para a Irlanda. Mais do que isso, no entanto, o dia se tornou uma celebração da Irlanda e do verde, do dourado (ou laranja) e do branco, as cores nacionais.

Londres tem ao lado de Nova York uma das maiores comunidades irlandesas fora da Irlanda. A maior concentração fica no bairro de Kilburn (meu vizinho), mas eles estão em toda a cidade. Embora oficialmente celebrado no dia 17 de março, o Dia de São Patrício foi comemorado em Londres com uma super festa na Trafalgar Square no último domingo, dia 16 de março, e uma parada que lembrava alguma tentativa de carnaval (muito, muito longe, claro).


Formada por bandas de músicas e comunidades irlandesas de Londres, a parada tinha também alguns carros mais diferentes, como esse da foto aí do lado. Eram muitos São Patrícios, todos de barba laranja e roupa verde. O mais legal de ver foi a descontração e a informalidade (mais do que amadorismo, afinal acho que o objetivo principal é diversão mesmo). Não havia cordas separando o público de quem desfilava e acredito que muitos verdes que desfilaram entraram na brincadeira na última hora.
As cores da Irlanda estavam por toda a parte e era uma variedade tremenda de chapéus, fantasias e maquiagens. A Guinness, uma cerveja preta super encorpada que é um dos maiores orgulhos irlandeses, estava presente não só nas mãos dos presentes, mas também na cabeça, em diferentes chapéus. Um show de alegria, apesar da chuva que teimava em cair.

10/03/2008

Homenagem no pier

Que tal homenagear quem você ama com uma placa em um pier da Inglaterra? Em Clevedon, pequena cidade no sudoeste do país, é possível encomendar uma placa a partir de 20 libras (cerca de R$ 67) que ficará eternamente instalada no pier. As mais caras, no entanto, chegam a custar 175 libras (cerca de R$ 593). As placas ficam prontas em apenas duas semanas e podem ser colocadas no chão do pier ou no encosto dos bancos.

Na verdade, você não compra a placa, mas sim a patrocina com doações mínimas de 20, 50, 85 e 175 libras (de acordo com o tamanho da placa e o número de palavras impressas). Esta forma de patrocínio foi uma das principais fontes de recursos para a restauração do Clevedon Pier, iniciada em 1989. Desde então, mais de 9.500 placas foram doadas e agora uma rifa sorteará o dono da placa de número 10.000.

Amores e saudades se intercalam entre as homenagens e é impossível não imaginar quem são aqueles personagens que se eternizam ali. Embora especial por se tratar de um pier, a prática de homenagear entes queridos com placas em bancos é muito comum no Reino Unido. Quem não lembra do filme Notting Hill, quando os personagens de Julia Roberts e Hugh Grant sentaram em um banco com uma homenagem de um casal que vivera décadas juntos?

Mais do que um pier, a cidade tem um clima de relíquia escondida (não aparece nos principais guias do Reino Unido). Um longo trajeto para caminhada na beira da praia, com pedras e não areia, reúne famílias e principalmente idosos. A vista do outro lado da praia é para o País de Gales, algo assim como Rio de Janeiro e Niterói.

São pouco mais de 20 mil habitantes, que trabalham principalmente em Bristol, uma das metrópoles do país, a pouco mais de meia hora dali. O curioso é que foi a primeira cidade que visitei até agora onde o comércio é formado apenas por lojas locais. Ok, talvez com a exceção dos supermercados, mas em geral é aquele comércio de cidade pequena, uma graça.







07/03/2008

Principe Harry e a imagem do Exercito Britanico no Afeganistao

Enrolada com os trabalhos do mestrado, nem comentei aqui a volta do principe Harry das operacoes do Exercito Britanico no Afeganistao e ja tinha ate desistido de falar da historia. Ao participar de uma palestra ontem, no entanto, acabei mudando de ideia.

O principe que adora a noite e ja chegou a se vestir com um uniforme nazista em uma festa a fantasia (com um pedido formal de desculpas depois, que nao chegou a apagar o episodio, claro) passou 10 semanas servindo no Afeganistao depois de ser impedido de ir para o Iraque no ano passado. Para garantir a seguranca das tropas (ja que ele seria um alvo mais do que desejado), a operacao foi mantida em segredo atraves de um acordo com a midia britanica, furado por um site americano.

Algumas semanas servindo ao pais em meio ao perigo certamente fizeram bem `a imagem do principe, cuja foto foi presenca garantida durante dias nos sites, jornais e televisao daqui. O principe Charles e o principe William foram rapidos em divulgar o quao orgulhosos estavam da coragem e do trabalho prestado pelo filho e irmao.

Mas a avaliacao do professor de Midia e Comunicacao da London South Bank University Philip Hammond, que acaba de lancar o livro 'Media, War and Postmodernity', e' de que mais do que uma campanha para melhorar a imagem do principe, sua ida para o Afeganistao faz parte de uma estrategia mais ampla para tentar tornar mais popular a operacao do Exercito Britanico no Afeganistao, que ja dura mais de seis anos e nao tem nenhuma previsao para terminar. Segundo ele, atualmente ha uma preocupacao maior em como o conflito esta sendo representado pela midia do que com o conflito em si.

Seu estudo se desenvolve na linha de como as guerras viraram um espetaculo da midia e uma tentativa de busca de sentido na pos-modernidade. Embora o debate do livro seja interessante, confesso que esperava mais, j'a que vejo pouca diferenca em relacao a outros estudos desenvolvidos logo depois da guerra no Iraque de 1991 (h'a mais de 15 anos!), como o do frances Jean Baudrillard.

OBS: Desculpem a falta de acentos deste teclado...